10 Favoritos de 2021

Como forma de fazer uma retrospectiva do ano de 2021 e deixar um registro cinematográfico próprio no blog, vou listar meus 10 filmes favoritos do ano em questão. O único critério é que seja um filme lançado entre 2019-2021 assistido pela primeira vez em 2021. Além dos filmes, um breve comentário sobre cada uma das obras.

10 - FROM BAKERSFIELD TO MOJAVE (2021, JAMES BENNING)


Primeiro filme que assisti do Benning e é impressionante como o americano parte de um mote estrutural para lidar com toda uma gama de míticas cinematográficas implícitas no mais corriqueiro dos acontecimentos. A própria evolução dos cenários e dos planos únicos diz muito sobre um caráter evolutivo -- e essencialmente mitológico -- do cinema. A forma ressignifica o cotidiano em prol de uma elucidação mística do mundo.

9 - MALIGNANT (2021, JAMES WAN)


O terror de James Wan é mais descontraído do que outros trabalhos do diretor, e é justamente essa liberdade -- tanto narrativa como na própria desconstrução temática e visual do longa -- que o faz ser superior em relação as produções anteriores do cineasta. Wan pode até trabalhar dentro de uma chave referencial clara, mas toda a autoconsciência televisiva e fanfarrice pastiche transformam o filme em um percurso altamente prazeroso em sua falta de compromisso com uma pretensa austeridade.

8 - LAST NIGHT IN SOHO (2021, EDGAR WRIGHT)


Confesso que eu era a primeira pessoa a criticar o Edgar Wright. Não sou muito fã de umas coisas mais recentes do diretor e estava pronto para deixar seu mais novo filme passar batido. Mas eu resolvi dar uma chance e acabou que foi um dos meus favoritos do ano, muito porque herda uma tendência ao lidar com um certo imaginário (que na maioria das vezes é o próprio imaginário de uma América contemporânea) que vem de Under the Silver Lake na forma como retrata sua mitologia interna como uma toca de coelho que se afunda nas próprias referências e informações. A desorganização estética e narrativa casa muito bem com o maneirismo inveterado do Wright, a partir do momento que o cara forma uma dinâmica ultra prazerosa partindo justamente do mote de acúmulo e do excesso.

7 - ANNETTE (2021, LEOS CARAX)  


Tudo o que David Lynch faz de errado em "Império dos Sonhos", Carax faz certo aqui. Ao meditar sobre o poder da representação na arte, o diretor assegura a essência cinematográfica presente no espetáculo. As imagens de Carax estão sempre fazendo parte de um mundo maior, como se o aparato fosse indissociável da ficção, fazendo com que a devoção performática se transforme no mais poderoso dos gestos.

6- THE SCARY OF SIXTY-FIRST (2021, DASHA NEKRASOVA)


Outro que me remeteu ao Under the Silver Lake, mas aqui dentro de uma pegada bem mais centrada no exploitation e no horror de baixo orçamento que ostenta a artificialidade do aparato. Inclui muito bem a banalidade da imagem cotidiana dentro de uma perspectiva de estranheza e desestabilização daquele contexto, ao mesmo tempo que vai amontoando várias conspirações e possíveis respostas obscuras para diversas questões místicas e esotéricas implícitas na crueza das imagens.

5 - IN FRONT OF YOUR FACE (2021, HONG SANG-SOO)


O cinema do sul-coreano parece cada vez mais indecifrável para mim. O que pode ser contra intuitivo dado em conta de que, devido a recorrência de temas e elementos, possa-se assumir que poderia ser mais fácil traçar uma linha de pensamento sobre a filmografia de Sang-soo. Mas parece que quanto mais fundo o diretor lapida seu método, mais específicas as coisas ficam. Esse pra mim é um filme sobre como as pessoas se apresentam ao mundo, sobre o que se pode tirar disso quando uma câmera ritualiza os gestos e observa os atores quase como um convite ao acaso, uma fórmula da espontaneidade. 

4 - LITTLE FISH (2020, CHAD HARTIGAN)


Descobri o filme por acaso em uma lista no Letterboxd e eu logo me apaixonei. Assisti por causa da Olivia Cooke que tinha feito alguns filmes que amo de paixão, e ela conseguiu mais um para entrar nessa categoria. O mais impressionante é como o diretor encontra uma maneira de colocar em cena todo o mote conceitual da perda de memória, de todos os caminhos abstratos e instáveis pelos quais isso passa. E não só isso, mas em estabelecer todo um contraste altamente poderoso entre a fragilidade do que vai sendo perdido em uma escala intimista e ao mesmo tempo gigantesca. O alcance simbólico que o filme encontra no relacionamento dos dois não é brincadeira, e de fato assegura o amor como uma única chance de resistência, uma única recorrência universal.

3 - MONSTER HUNTER (2020, PAUL W. S. ANDERSON)

Que outro diretor de Hollywood faz um filme de fantasia que é tão material, físico, "realista", com uma mitologia tão excêntrica? Ou não só uma mitologia, no sentido de entornos da narrativa ou algo do tipo, mas de fato em uma condição elementar do mundo que simplesmente se rende aos seus exageros enquanto mantém uma noção de escala e peso que pouquíssimos possuem. O cara simplesmente instrumentaliza toda essa fixação do espectador contemporâneo com verossimilhança e lança mão de  uma minuciosidade formal que atua sempre prol de uma função essencial do espetáculo cinematográfico, que apresenta o arsenal necessário para verdadeiramente ressucitar o cinema de atrações em todos os seus mais puros encantos.

2 - BENEDETTA (2021, PAUL VERHOEVEN)


A fábula religiosa verhoeveniana encontra um meio termo gracioso entre as sátiras ao cristianismo e uma certa seriedade dramática. O que elucida ainda mais a dicotomia que o filme estabelece entre o real e o abertamente fantasioso, da qual o cineasta não tem vergonha nenhuma em deixar claro as diferenças nesses dois lados. O que é pra ser subversivo é tão violento e espirituoso como qualquer outra coisa que o Verhoeven fez na carreira (o Jesus decapitador é muito divertido), e o drama é mais engajante do que o de qualquer outro longa europeu que esteve em Cannes nos últimos tempos. Além do mais, o filme ainda consegue pincelar um clima apocalíptico e estilizado que reforça toda a continuidade visual do filme ao mesmo tempo que potencializa o pacto ficcional e o peso de todas as relações ali presentes. Além de ter momentos engraçadíssimos. Não dá para querer muita coisa mais de um filme.

1 - DUNE (2021, DENIS VILLENEUVE)


O Villeneuve encontrou o material perfeito para casar com suas obsessões estéticas. Se seu formalismo ambíguo transformava Blade Runner: 2049 em uma obra covarde, aqui a assepsia dos planos dialoga diretamente com um propósito conceitual na obra de Frank Herbert. O diretor aqui assume apelos mais básicos de uma ficção científica qualquer -- a trama do escolhido de fato guia a narrativa -- mas incorpora isso dentro de uma operação formal que recusa sempre o clímax, que abraça a derrota e o fracasso. Nada é magnificado por Villeneuve aqui, tudo é apenas parte de um fluxo, de um destino único que retorna ao essencial para contar uma história sobre perdas, sobre expectativas fantásticas que se deparam com uma realidade decadente. 



























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